quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Se Todos Fossem No Mundo Iguais a Você


Para quem não sabe, meu avô era pastor da Assembleia de Deus. Sim, ele era PASTOR. A caixa alta é porque talvez ele tenha sido o último, ou único, pastor que conheci. Daqueles que se preocupavam com a comunidade, meu avô era querido por onde passava. Extremamente querido. Por onde estivesse deixava sua marca. Fosse porque distribuía pão e leite antes de o dia amanhecer à comunidade carente, fosse pelos lanches comunitários que oferecia, fosse porque devolvia o dízimo àqueles que sabia que não tinham condições - nesse caso, nunca conheci outro que o fizesse. Daqueles que não enriquecem e daqueles que não se envolvem com política e eleições. Pasmem!

Sempre que estamos às vésperas de eleição, em período de campanha eleitoral, a lembrança mais forte que tenho é a dele. Lembro-me de suas palavras firmes com relação à utilização do espaço religioso: "Irmãos, igreja não é palanque! Púlpito é para pregação do evangelho e não para campanha política!". Alguns o compreendiam, outros o achavam radical e ainda havia os que o achavam ingênuo pois não se aproveitava de sua influência. Ele se recusava a fazer campanha, recusava-se a ser candidato - embora procurado por diversos partidos. Meu avô acreditava que não se deveria misturar política e religião, não porque não se devesse discutir, mas porque a mistura geraria uma confusão de proporções desastrosas.

Meu avô, José Francisco Marques (Vozinho José)


Entre tantos serviços que costumava oferecer à comunidade, destacou-se durante alguns anos a escola primária que havia montado no Jardim Nova Esperança, aqui em Goiânia. O Instituto Evangélico Dona Iraci, que levava o nome de sua mãe, sobrevivia graças a um convênio com a Prefeitura de Goiânia e atendia a centenas de crianças. Figurou o instituto durante esses anos como uma das melhores escolas da região, inclusive. Acontece que a vida nem sempre é justa, o tal sistema político funciona como um rolo compressor. Existe um episódio em sua vida que ilustra o peso dessa postura de não envolvimento com partidos políticos e campanhas eleitorais.

Eis que, durante o seu funcionamento, o instituto sofreu uma forte ameaça política. "Ou o senhor apoia o candidato, ou, se não apoiar e ele ganhar, cortamos o convênio". Essas foram as duras palavras dos responsáveis pela campanha do candidato à prefeitura, Darci Accorsi, do PT. Acontece que meu avô nunca se sujeitou a ameaças. Ele não apoiou. O candidato venceu. O convênio, conforme prometido, foi cortado. A escola teve de fechar. A ferida para toda a família talvez nunca feche, são sempre vivas para nós a tristeza no olhar e a dor que meu avô sentia ao ter que comunicar o fechamento às famílias. Centenas de crianças remanejadas, professores e outros funcionários, idem. Foi altíssimo o preço que meu avô pagou por sua convicção de que seria maléfico que sua influência religiosa e social tivesse ingerência na escolha política da comunidade. Ele arriscou ter o seu sonho de educação sepultado, pois sabia que aquele seria um caminho sem volta. Ele sabia que, se sucumbisse àquela ameaça política, se tornaria refém para sempre daquela prática.

Muita gente não entendeu sua atitude, muita gente ainda não entende. Ocorre que meu avô era pastor e pastor ele escolheu ser - e foi - até os últimos dias da sua vida.


terça-feira, 19 de abril de 2016

Relato de (des)esperança

Nasci no ano de 1984, um ano antes do 'fim da ditadura' no Brasil, não convivi de perto com os seus horrores e, até bem pouco tempo, o máximo de contato que tinha com o período foi por meio de leituras de livros de História. Eis que, em abril de 2014, faço minha inscrição no Sesc Dramaturgia - Leituras em Cena, cujo tema era "50 Anos da Ditadura Militar - Dramaturgia da Resistência". Eu acabava de iniciar as aulas de teatro e essa seria minha primeira apresentação, o texto era Nem Mesmo Todo o Oceano, de Alcione Araújo. Para além da emoção de estar 'no palco' pela primeira vez, o projeto mudou para sempre meu sentimento com relação ao período de trevas brasileiro.
Talvez todos já tenhamos conhecimento de que atores façam laboratórios para seus personagens, é o que atribui verdade à atuação, é o que convence quem assiste e é o que mexe, profundamente, com o ator. O desafio a que me propus era o de interpretar um médico que se tornou algoz em meio ao esgoto do sistema ditatorial vigente. Assisti a documentários, estudei, li bastante sobre o que se praticava em nome da manutenção da ordem no país.


A imersão me deixou absolutamente chocado. Não que já não tivesse ideia do que ocorria, mas se materializava para mim, naquele momento, toda a violência à qual os opositores do governo eram submetidos. Fiquei ainda mais estarrecido com os relatos das técnicas de tortura aplicadas às mulheres. A humilhação, a violação do corpo, o estupro como forma correcional me fizeram sucumbir à tristeza, à indignação, ao nojo. A mistura de sentimentos que me acometeram era diferente de tudo o que eu já havia vivenciado. Ainda hoje, ao lembrar desta experiência, falta a coordenação motora para continuar digitando, os dedos tremem, o nó na garganta é inevitável. Segue uma longa pausa, recobro a normalidade - ou pelo menos, parte dela - e posso voltar ao assunto.
Eu, que não vivi os horrores da ditadura, emociono-me, revolto-me. Eu, que não passei pelos porões dos DOPS, jamais teria a pretensão de mensurar o sentimento de quem de fato sentiu a tortura na pele ao presenciar uma homenagem ao mais abjeto torturador - se é possível hierarquizar abjeção, nesse caso -, coronel Brilhante Ustra, em plena Câmara dos Deputados, por um político boçal e fascista. Eu não vivi os horrores da ditadura, mas tenho empatia. Não é preciso viver os horrores da ditadura para ter conhecimento histórico e cultura, e conhecimento histórico e cultura mudam a forma de ver o mundo, mudam a forma de sentir o mundo, mudam a forma de se posicionar no mundo.
Cada argumento que leio em prol da ditadura militar, os posicionamentos radicais e violentos vociferados nas redes sociais, fazem com que eu perca um pouquinho de fé nesse país em que vivemos. Aí eu paro, reflito e percebo que o que me consola é que também há aqueles que defendem a justiça, que defendem a democracia, que defendem a liberdade, que, assim como eu, acham que a evolução - ainda que penosa para alguns - seja possível. O que me consola é saber que houve, há e sempre haverá essas pessoas. É só o que me consola, é só o que me faz não desistir de um país possível. Por enquanto.

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Dona Chica e as 3 Conchas

Hoje acordei cantarolando Patrícia Marx: "Certo ou errado? Certo ou errado? Quem não pula o muro não aprende a se arriscar. Não tá com nada u ô ô u, não tá com nada". Parei. Logo me veio o pensamento sobre como essa música é inadequada para os dias atuais. 
Nos meus tempos de infância - ah! longínquos tempos - a gente cantava feliz "atirei o pau no gato" e brincava de roda se assustando com o "berrô que o gato deu". Aí veio alguém e disse que isso era muito errado. Soube que alteraram a música para "não atire o pau no gato, porque isso não se faz". Temo que o boi da cara preta tenha sido proibido de assustar e que a cuca não pegue mais nenhum neném. Arrancaram até mesmo o cachimbo do saci! 
Durante todas essas divagações me veio, ainda, a recordação de um filme que também vi quando era criança - e várias vezes depois disso -, 'O Demolidor', com Silvester Stalone e Wesley Snipes. O filme se passava num futuro pós-criogenia, as rádios tocavam somente jingles e as pessoas eram meio que... limítrofes, tinham sua liberdade cerceada de todas as maneiras e eram felicíssimas com essa situação.
Lembro que sempre ria muito e achava ser um futuro inalcançável. Hoje, vejo que ele está cada vez mais próximo. A onda do politicamente correto extremo ataca do cancioneiro popular a aberturas de novelas. E o mundo vai ficando cada vez mais chato, cada vez mais radical e com uma quantidade de fiscais absurda.
Quer saber? Acho que o melhor que temos a fazer é aprender logo para que servem as três conchas.


terça-feira, 18 de agosto de 2015

A História de Um Dia Sem Fim

Sabe quando você passa o dia todo certo de que está doente? Umas sensações estranhas, inexplicáveis, diferentes. Um dia daqueles que você quer que termine e apenas termine, sem grandes desfechos. Pois é, hoje foi desses dias. Não é raro, no entanto, que não sejamos agraciados com a realização de nossos desejos. E o que parecia só um dia ruim, passou a ser um dos mais atípicos por que já passei.

Ainda no começo da noite sou surpreendido por uma voz que vem da rua gritando por socorro. Olho pela janela do apartamento, é uma mulher desesperada pois acaba de ser assaltada. Dá tempo de ver os ladrões correndo e passando pela porta do meu prédio. É assustador quando você se dá conta de que está totalmente desprotegido e sujeito a tantas coisas nas quais muitas vezes nem pensa. Mas elas são reais, esses riscos são palpáveis e quando você está sensibilizado - por isso falei do meu sentimento ao longo do dia - o medo se potencializa. A mulher é amparada pelos vizinhos da casa em frente, mas eu tremo e assim fico por vários minutos. Nervoso, meu coração palpita, pelo simples fato de que ainda não entendo a violência como algo normal. Demoro algum tempo para me restabelecer.   

Resolvo me distrair, parar de pensar. Ligo a TV. Vejo novelas, um pedaço do programa da Xuxa, jogo no Facebook. Consigo me descontrair um pouco e relaxar. Entretanto, dormir não está fácil, tampouco ficar totalmente acordado. Solução: Youtube. Sempre recorro aos clipes de músicas que gosto para aliviar um pouco a barra quando me sinto incomodado.

São 2h40min da madrugada. Eu com os fones de ouvido. Ouço um barulho. Tiro os fones. Barulho na porta da sala. Parece alguém querendo entrar, forçando a fechadura. A campainha toca. Outra vez. Mais um toque. Tomo coragem e resolvo checar o que acontece, de perto. Do lado de dentro pergunto quem é. O homem, de voz rouca e baixa, responde que é um amigo que entrou por engano e não consegue sair. Acho estranho. Ele pede que eu abra a porta para ajudá-lo. Nego. Ele insiste que não é louco e repete que não consegue sair. Oriento que ele deve chamar o elevador e descer. Ele parece nervoso, confuso e continua a pedir que eu abra a porta. Volto a afirmar, agora de forma mais ríspida, que não posso atendê-lo a essa hora da noite e torno a lhe dar a mesma orientação. Ele chama o elevador e parece descer. Permaneço na sala, próximo à porta, para conferir se não há mais barulho no corredor. Silêncio fúnebre.

O silêncio agora parece ecoar. Junto com ele os questionamentos germinam e não me deixam dormir. Será que fui rude? E se realmente era alguém precisando de ajuda? Devia eu ter aberto a porta? Até que ponto o medo da violência vai me assombrar a ponto de primeiro desconfiar de qualquer um, de qualquer história? 

Agora, pressuponho, não conseguirei dormir. Sabem, sou daqueles que não dormem quando pensam. E nesse momento, dentro da minha mente, imperam o fúnebre silêncio do corredor e o caos das histéricas perguntas sem resposta.

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

O Dia Em Que Me Trajei de Branco e Deixei Clarear

Não sou crítico de teatro, portanto não esperem ler aqui uma crítica especializada. Sou ator, em início de formação, tampouco avaliarei técnica interpretativa. O que deixarei neste breve texto serão impressões de um espectador. E, na condição de espectador, tentarei expor livremente sentimentos.

Vinha, há algum tempo, acompanhando o êxito do espetáculo Deixa Clarear, de Márcia Zanelatto, no Rio de Janeiro, e a vontade de conferir já tomava conta de mim. Fiquei radiante quando vi que seria apresentado no encerramento da programação de aniversário de 68 anos do SESC, no Teatro SESC Centro, em Goiânia.

Trajei-me de dois tons de branco, colar e pulseiras e fui ao teatro. Estava ansioso, fã incondicional que sou de Clara Nunes. Uma parada no caminho, duas cervejas para relaxar, uma boa conversa, e é chegada a grande hora. Entro no teatro já na expectativa, já nervoso, já sorrindo. Sim, eu estava feliz, parecia que tudo ia ser maravilhoso.

Começa a peça. Entra uma menina - novinha, pequenina, branquinha, loirinha - e começa a encenar uma Clara criança. Mas não só Clara criança a moça interpreta, ela faz do seu corpo e da sua voz a casa de vários personagens. A platéia ri, eu rio, e já começo a ser enredado pela atmosfera de Deixa Clarear.

A moça se apresenta, é Clara também, Clara Santhana, que de nome tão longo só faltou o 'Orleans e Bragança'. Encanto-me com sua versatilidade e prossigo em meu abrir de alma. Clara, de pequena, cresce e me mostra Clara Nunes.


O texto se desenha, e se poetiza, e se envolve de música, e se banha de brancos. Os mais belos e profundos sentimentos saem pelos poros e insistem em fazer eriçar até o último fio de cabelo. É involuntário. Já não há volta, Clara Nunes e seu sorriso estão diante dos meus olhos. Olhos esses que marejam e sorriem, e que querem a todo momento eternizar aquele instante. Intensidade, leveza, e a prova de que ambos podem coexistir, de que quando isso é possível a beleza transcende.

A dança de Clara, o sorriso de Clara, o sentimento de Clara, todas as cores que têm os brancos de Clara, a Claridade. As palavras somem, os pensamentos se esvaem, só consigo sentir. Sentimento bom, indescritível, inenarrável. Não estou mais em mim, mas sinto. Arrebatamento. Clara dá licença a Iansã, e Oyá vem linda, rápida, intensa e se apresenta a mim como o vento forte que leva e junto com a tempestade me lava as máculas. Calmaria. Águas, corredeiras, rios e mares correm seus caminhos e me ensinam que o importante é continuar. Sempre em frente.

Clara clareia e os dois tons de branco que eu vestia parecem ter absorvido todos os seus brancos, toda a sua luz. Deixa Clarear é mesmo um clarear de alma. É muito mais que uma peça musical, é uma sessão de tratamento do espírito.

Acaba a sessão e eu continuo sorrindo, não mais como antes. Leve. Intenso. Agora sorriem com meus lábios, minha alma e meus olhos. E hoje o que tenho a dizer a todos os envolvidos nesse projeto é 'apenas': Muito obrigado e Axé!

quinta-feira, 11 de abril de 2013

As Escolhas Que, De Fato, Você Faz

Oi, gente,

Até que estou demorando menos para voltar por aqui, né? Esse é o intuito mesmo, ser mais freqüente no blog.
Sabem, essa polêmica toda de casamento gay, pastor racista e homofóbico, radicais religiosos e tudo o que vem como guarnição tem me feito pensar muito no meu falecido avô, José, carinhosamente chamado de Pastor Marques. Sim meu avô era pastor, da Assembléia de Deus. Para quem não conhece a Assembléia de Deus é uma igreja evangélica pentecostal bem tradicional, daquelas típicas mesmo. Por aí já dá para perceber qual era o posicionamento natural do meu avô com relação a todas essas polêmicas que estamos vivenciando em nossa sociedade. A Assembléia de Deus, inclusive, fez, nesta semana, um manifesto em apoio ao psicopata Pastor Marco Feliciano.
Ok, antes que eu me irrite mais - e esse não é o intuito - e já conhecidas as origens religiosas do meu avô e a postura da denominação religiosa que ele representava, posso contar a história que mais está trazendo a figura dele aos meus pensamentos e sonhos - já foram dois sonhos com ele nesta semana.
Ocorre que no final do ano de 2011 fui à casa do meu avô, em Rubiataba, e fiz aquela, que não sabia eu, seria a última visita a ele em sua casa. Tivemos uma longa conversa sobre assuntos variados. Ele me fez rir, como de praxe. Falou sobre coisa séria, como de praxe. E sobre o orgulho que sentia com relação aos filhos e netos. Além, é claro, de reforçar a importância do conhecimento, da leitura e da análise conjuntural do mundo que sempre devemos fazer para saber onde estamos vivendo. Tudo isso foi normal. Nossas conversas sempre foram assim. Meu avô - abruptamente distanciado da possibilidade de estudar regularmente, ainda criança - nunca se curvou à ignorância. Via TV, lia jornais, revistas, livros e, obviamente, o seu livro preferido: a Bíblia. Essa ele conhecia como ninguém, sabia, de cór, o livro, capítulo, versículo que referenciava para tratar de qualquer assunto que fosse.
E foi exatamente num desses momentos que ele me surpreendeu. Ele, logicamente, sabia da minha condição sexual e poderia tranqüilamente dizer o que quisesse sobre isso, afinal eu estava na sua casa, sob o seu teto, sujeito à sua autoridade. Foi o que ele fez - não abertamente, porque ele sabia se portar muito diplomaticamente - mas fez. E tão diplomaticamente quanto sabia se portar, introduziu o assunto sem que eu nem percebesse. E as palavras que ele me disse foram estas:
- Umas das pregações que eu mais tenho feito na igreja é a de Mateus 7:1-2 que diz "Não julgueis, para que não sejais julgados. Porque com o juízo com que julgardes sereis julgados, e com a medida com que tiverdes medido vos hão de medir a vós." Porque o que mais tem dentro da igreja é irmão cuidando da vida do outro, ou de quem nem está lá, e esquecendo da própria. Só Jesus pode julgar e os irmãos têm que entender isso e parar com a fofoca e a maledicência. Ninguém tem o direito de julgar ninguém.
Essas palavras foram, para mim, a maior prova de amor que já recebi dele. Elas me ensinaram que na vida você tem mesmo muitas opções. Meu avô, já no fim de sua caminhada, demonstrou que optara pelo amor e pelo respeito.
O decepcionante é pensar que muitas pessoas não se permitem escolher, elas se condicionam a escolhas alheias e se sujeitam a dogmas absurdos. Eu, na minha vida, já escolhi várias vezes e sei que terei ainda que considerar muitas opções. Eu optei por liberdade ao invés de cárcere, por criticidade ao invés de alienação, por amor ao invés de ódio e por ser feliz ao invés de ser evangélico.
E você? Quais são as opções que tem feito na vida? Será que elas têm valido a pena?

quarta-feira, 27 de março de 2013

O Bacanal Evangélico e o Nocaute aos Direitos Humanos no Brasil

Outro dia escrevi, no facebook, sobre a moderação, o meio-termo e a não radicalidade das opiniões, mas a cada dia que passa fico mais incomodado com o que ocorre à minha volta. De fato, eu havia me prometido que não entraria no mérito religioso e que não participaria dessa polêmica guerra civil ideológica que nossa sociedade está vivendo. Mas se vocês bem me conhecem, estavam só esperando para ver quanto tempo eu agüentaria, não é? Pois é, pouco.

Ocorre que a cada dia que passa eu vejo que estamos caminhando para uma sociedade extremamente intolerante e radical. As igrejas evangélicas, com seus controversos líderes infiltrados no seio da representação democrática, estão criando um exército disposto a tudo para defender os 'princípios cristãos'. Sob a pele de cordeiro da 'liberdade de expressão' está escondida a mais perversa e perigosa postura inquisidora. A já conhecida perversidade humana - aquela que nos faz vibrar e aplaudir quando um bandido é morto, ou quando ocorre uma chacina em um presídio - une-se a uma manipulação dogmático-religiosa e a um radicalismo altamente nocivos ao convívio social.

As propostas da bancada evangélica e sua postura só demonstram que ela não tem interesse absolutamente algum em promover justiça e paz social. Ora, um país em paz e com justiça social representaria um grande risco para a sua dominação. Os líderes evangélicos conduzem suas ovelhas e as adestram para serem obedientes e acríticas, e tem funcionado. Ora, o evangelho de Cristo eles jogam na lata do lixo. O evangelho do amor para eles não tem valor. A interpretação conveniente da bíblia é feita pelos pastores e aceita pelas ovelhas. Então, eles criam um novo evangelho, um evangelho que não é bem assim de Cristo. É uma doutrina torta, moldada, que serve a interesses escusos e vis. Uma doutrina que tem êxito ante as mentes mais reacionárias e cruéis. Está se formando um grande exército da intolerância, que tem demonstrado sua crueldade especialmente por meio das redes sociais. São militantes treinados para mentir, incitar o ódio, distorcer discursos e praticar todo tipo de mal que conseguirem, sob o pretexto de estarem em defesa da moral, da família e dos bons costumes. Pasmem! O exército cresce e ganha força. Arrisco-me até a dizer que seja uma nova corrente teológica: a teologia do ódio. Gente que xinga, difama, mente, agride e, quem sabe em breve, queima os pecadores na fogueira.

Tenho pavor do que está por vir, não parece nem um pouco esperançoso. A influência evangélica aumenta na política e a cada dia a democracia leva um soco na cara: como, por exemplo, um partido que se denomina cristão e participa de um conluio para colocar um líder religioso que discursa contra minorias na presidência de uma comissão que trata exatamente deste assunto, para tirar o foco de outras posturas ainda mais inadmissíveis; ou ainda, a proposta de entidades religiosas poderem questionar a constitucionalidade de leis junto ao STF. Querer suprimir a Constituição de um país por um livro religioso não tem nada de belo, nem é digno de aplausos. O Brasil retrocede rumo a uma triste e sombria teocracia.

A violência praticada pela supressão dos direitos à liberdade, em suas mais variadas formas, é digna de lágrimas. Lágrimas de sangue, de todos aqueles que sofreram, lutaram e se sacrificaram na expectativa de que nós vivêssemos numa sociedade mais digna, justa e tolerante. Os religiosos que conduzem o seu gado por esse caminho de intrigas e enganos banham-se no sangue inocente de todos aqueles que morrem em virtude dessas posturas. E, como porcos, chafurdam num lamaçal de corrupção, ganância e mentiras.

Estamos presenciando um momento histórico, uma nova cruzada, uma 'guerra santa', em território brasileiro. Acho que a história não conseguiu ensinar nada a ninguém. Ou melhor, acho que a história não conseguiu abrir os olhos da grande massa, dita povo. Ela continua ignara - estúpida mesmo - e com uma criticidade medíocre, se é que há alguma. A pergunta que fica é: será que ainda resta esperança?



sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Por Onde Andará o Português?

Oi, gente!

Faz tempo, muito tempo, que não escrevo por aqui. Na verdade isso acontece porque eu me esqueço mesmo e porque com o advento do Facebook, a gente acaba não fazendo outra coisa. Geralmente eu reclamo bastante e ponho defeito em tudo, como vocês já devem ter percebido. Desta vez não vai ser diferente.

Ocorre que, a cada dia que passa, fico mais chocado em como, cada vez mais, as pessoas sabem menos escrever e falar em Português. Não, não estou falando do Português de Portugal, é o daqui mesmo, do Brasil.

Não precisa ser um lingüista, ou um profundo conhecedor do idioma, basta ter noção de acentuação, ortografia e pontuação. Isso já ajuda, e muito. Acho que tenho até que tomar cuidado ao falar desse assunto porque daqui a pouco vão me acusar de preconceito lingüístico, vão me chamar de 'representante da hegemonia branca, de classe média e heterossexual', enfim, todo esse discurso enfadonho que já conhecemos.

Notem que eu não estou cobrando de ninguém que abandone a linguagem coloquial e utilize-se apenas da linguagem culta em suas conversas, até porque isso seria muito chato, apesar de elegante. Mas linguagem coloquial é falar 'a gente foi' e não 'umas meia hora', entende? Sim, a falta de plural, concordância e regência na língua falada assusta e deixa essa fala muito feia.

E a escrita. Ah, a escrita. Outro dia recebi uma correspondência aqui na biblioteca que estava endereçada ao 'campos' Goiânia! E o pior, esse documento vinha remetido por outro 'campos' do IFG. Aí vai aparecer alguém para falar 'ah, mas o que interessa é a comunicação; se houve comunicação, cumpriu-se o propósito'. Acontece que, às vezes, os textos são tão mal escritos que essa comunicação fica comprometida e não dá mesmo para se entender a mensagem. Então, não escrever direito atrapalha a vida de todo mundo porque se torna uma reação em cadeia. Se a comunicação começa com ruído, no final ela vai apresentar um estrondo ensurdecedor.

A propósito, acho um despropósito esse Novo Acordo Ortográfico. Ele fez uma verdadeira bagunça com a hifenização e os acentos que suprimiu são essenciais para o conhecimento da pronúncia, isso sem falar do trema, pobre trema, tão simpático, útil e foi brutalmente extinto. Tomara que esse desrespeito à nossa língua não vingue. Já foi adiado para 2016 e até lá eu continuo escrevendo do mesmo jeito e prestigiando o trema.

Então, é isto, desabafo posto, encerro o post, que, em suma, é só pra pedir um pouco mais de estima pela Língua Portuguesa. Assim como lutamos para valorizar nossa cultura, nossos ancestrais, nossas raízes, temos que lutar pela sobrevivência do Português, ou daqui a pouco vamos perder a capacidade de nos comunicar.

Um abraço para vocês, e até a próxima postagem.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

A Crise Internacional, A Marolinha e o Caos na Educação

Acabo de ler a matéria-capa da Isto É desta semana, Apocalipse Não - o que há de real na crise. Particularmente não gosto dessa publicação, Isto É, porque acho muito tendenciosa, muito petista. Se a Veja é imprensa marrom, a Isto É é imprensa alvi-rubra e nesse duelo de cores prefiro não escolher. Deixando de lado a minha antipatia pela revista, li sobre a crise e, além de achar que o título da matéria poderia ser facilmente trocado por "E teve boatos que a gente tava na pior", faço uma breve análise da abordagem.

Logo na capa da matéria, não da revista, temos duas fotos: uma de Obama com uma expressão preocupada e outra de Dilma com as sobrancelhas arqueadas e um meio sorriso nos lábios. Sabemos que os Estados Unidos estão passando por uma crise que ameaça o mundo todo e não se fala em outra coisa, nos últimos dias. A crise internacional é inevitável, segundo especialistas, mas o que me chamou a atenção foi o fato de todas as análises especializadas indicarem o preparo do Brasil para enfrentar a crise. Lembrei-me do famigerado ex-presidente Lula e sua analogia dos efeitos da crise internacional de 2008, por ele comparada à uma tsunami, à uma marolinha para o Brasil.

Ora, evidentemente não torcemos para que o Brasil sofra como Grécia, Portugal, e outros países europeus com essa crise. Ficamos exultantes, inclusive, que o país esteja tão preparado para enfrentar a crise. O Brasil demonstra força para enfrentar a crise quando aparece como o quarto maior credor dos Estados Unidos. As empresas brasileiras, segundo a publicação, têm um aumento do lucro líquido de 40,5% e no lucro operacional de 28,2%, em comparação ao mesmo período do ano passado; a indústria está a todo vapor, com crescimento de 23,1% na área de material de transporte, 20,8% na de instrumentos médicos, 9,5% na de aeronáutica, e outros números que indicam crescimento igualmente animadores, se comparados ainda ao mesmo período do ano passado; as contratações estão em alta: foram gerados, entre janeiro e junho, 1,4 milhão de empregos com carteira assinada no país, apenas em junho foram gerados 215 mil postos de trabalho. Além disso, as reservas cambiais do Brasil já passam de US$ 350 bilhões; o Banco Central tem margem de manobra para mudar a política monetária e cortar a taxa básica de juros, estimulando a economia; e o nível de endividamento das famílias brasileiras é baixo, se comparado com o índice americano. Portanto, se levarmos em consideração apenas os números apresentados, perceberemos que essa crise também não passará de uma marolinha para o nosso país.

"Nunca antes na história desse país" as coisas estiveram tão bem, não é verdade? É o que parece, ou melhor, é o que é para parecer. A mesma publicação não dá notícia alguma dos mais de 60 dias de greve dos servidores técnico-administrativos das Universidades Federais, ou sobre os mais de 170 campus/campi de Institutos Federais, CEFETs e Agrotécnicas, em 21 estados brasileiros, que também estão em greve. É preocupante que o PT faça a política que tanto criticou, a de se concentrar em números, em quantidade, em vez de qualidade.

A greve dos servidores técnico-administrativos e docentes da educação federal não é apenas por aumento de salário, salário que o Guido Mantega já havia dito no ano passado que está muito bom - e não está. A greve é pelo investimento na educação e pela não precarização do ensino. O governo Dilma diminuiu os investimentos em educação, proporcionalmente ao PIB. Dilma anunciou nesta semana, a criação de mais 120 Institutos Federais e nem acena com a possibilidade de negociar com os servidores em greve. A política de massa ganha força. Obras e mais obras para fazer volume e mostrar aos brasileiros o quanto o governo está trabalhando. Já vimos isso antes e os resultados não são nada animadores. Certamente esses 120 IFs nascerão sucateados, como já temos observado nos campus/campi recém-inaugurados. Nascem sem laboratório, sem biblioteca, sem estrutura nenhuma para abrigar qualquer demanda de ensino que seja.

Não interessa ao PT e nem à presidente Dilma a educação. Interessam os lucros cada vez mais exorbitantes dos grandes capitalistas e a mão-de-obra cada vez mais alienada - Karl Marx manda lembranças. Qual é o interesse em educar os trabalhadores para que eles se tornem cidadãos conscientes e questionadores? Nenhum. Há interesse sim em formar os eternos "apertadores de parafuso", agora promovidos a "profissionais multiuso", que desempenhem diversas funções e que não exerçam a criticidade. O governo investe pesado para a aprovação do PRONATEC, que, em suma, significa injetar dinheiro no sistema S, para que ele forme os profissionais acima mencionados. Investir na rede privada de ensino e sucatear a rede federal é o que o atual governo pretende e tem praticado. E justo esse grupo que tanto apedrejou a política de educação do governo FHC e o seu então Ministro da Educação, Paulo Renato, aplica os mesmos conceitos para conduzir a educação no país, na atualidade.

Quando é que o Brasil vai acordar para tudo isso? Historicamente a educação no Brasil caminha para a falência e nós não podemos ficar sentados esperando que isso aconteceça. O momento é de união entre docentes, técnicos-administrativos, estudantes e comunidade para pressionar o governo por uma educação, de fato, pública, gratuita e de qualidade. É hora de botar o bloco na rua: o bloco pela Educação Brasileira.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

O Frisson Causado pelas Opiniões, na Internet.

Na era da internet e das redes sociais, as informações se popularizam com a mesma velocidade com que caem no esquecimento. Talvez o twitter seja o principal responsável por essa dinâmica. Os trending topics, assuntos mais comentados no twitter, despertam curiosidade nos usuários que acabam por pesquisar os motivos pelos quais aqueles tópicos são os mais comentados.

A cada dia uma nova polêmica. Pontos-de-vista defendidos com uma ferocidade típica de quem se esconde por trás de um nickname. Argumentos sem fundamento ou cegados por ideologias obsoletas se destacam e tomam o espaço que, na verdade, deveria ser dado a quem, de fato, possui argumentos.

O debate, certamente, é sempre válido. O que me preocupa é que ele está cada vez mais superficial e fugaz. Daqui a uma semana ninguém se lembrará dos assuntos mais comentados de hoje e muito menos da importância que se deu ou se deveria ter sido dada a eles.

Quando virá a superação do frisson das polêmicas? Espero que logo, pois está cada dia mais difícil agüentar os pseudo-intelectuais que surgem todos os dias nas redes sociais. Sinceramente, nesse cenário, prefiro ser um debatedor mediano a um efêmero algoz.